quinta-feira, 26 de novembro de 2009

como fazer uma entrevista em 90 minutos

1)Qual é o teu diagnóstico?

Transtorno de personalidade dissocial segundo o CID 10 ou transtorno anti social de personalidade segundo o DSM-IV-TR. Rasgando o verbo, eu sou uma psicopata!!! Vocês não têm medo de mim?

Não. Sabemos muito bem que ser psicopata como tu diz, não significa ser um serial killer. E tu sabe a diferença entre o Cid 10 e o dsm?

Sei sim. O Cid 10 é segundo a OMS e o DSM-IV-TR É segundo a associação americana de psiquiatria. Eu pessoalmente prefiro a nomeclatura do DSM-IV-TR. Apesar de ter um código um pouquinho mais complicado: 301.7, eu acho que o termo anti social cabe mais em mim do que o termo dissocial. Mas no Brasil se usa o Cid-10: f60.2, então meu diagnóstico é esse: transtorno de personalidade dissocial.

*** Note como nossa paciente faz questão de se mostrar conhecedora do assunto, numa tentativa de nos seduzir pela sua Inteligência. Típico do transtorno, mas isso deixa dúvidas se a paciente foi capaz de manipular o psiquiatra responsável para receber alta antes do tempo necessário***

Dar uma breve explicação sobre o transtorno

2)Teu transtorno influencia a tua vida? Se sim, como?

Não sei! Não consigo me imaginar normal!

Por que não?

Ah porque... sei lá...

Sabe, teve uma época em que eu consegui me estabilizar. Trabalhava, estudava, tinha um marido que me amava, mas quer saber?! Eu achava tudo isso um saco!

E depois?

Depois foi que minhas queixas no psiquiatra eram sempre as mesmas: Que minha vida tava um saco.

E ela continua um saco até hoje?

Depois que eu fui internada sim, todo mundo que sabe da minha internação segue os meus passos. Já não posso mais ficar sozinha, sair sozinha e tudo mais. A perseguição é tanta que eu não posso mais nem usar o banheiro de porta de fechada.

Mas e antes da internação?

Bom, depois de tanto reclamar que minha vida tava um saco e minha psiquiatra não fazer nada a respeito, eu decidi chutar o pau da barraca!

Como assim?

Sabe? Os remédios me engordaram muito. Meu marido já não tinha mais interesse sexual em mim, e inclusive me chamava de “minha gordinha”. Cara eu odeio isso O-D-E-I-O !!! Botava minha auto estima lá em baixo. Então, o que é que eu fiz?! Larguei os remédios e me empenhei na eterna busca da anfetamina perdida!

E as anfetaminas não te fizeram mal?

Ui! Surtei um monte de vezes, mas continuava tomando porque a cada quilo perdido, meu marido me chamava ainda mais de gostosa! Tanto é que eu desenvolvi T.A.?

Transtorno alimentar?

Sim... Dá licença um pouquinho porque eu acho que minha sogra está mexendo na minha cocaína.

*3 minutos depois* ***Não se mostre assustado, existe coisa pior***

Não, não era ela. Era paranóia minha! È que eu estou com 10 G morrendo de medo que meu marido pegue e jogue fora.

10 G? ! São 10 gramas?

Isso mesmo, dez gramas.

Tu usa cocaína frequentemente?

Não, só quando eu não tenho anfetaminas como hoje... Sabe o que eu acho injusto?!

O que?

É que para comprar remédios para emagrecer tu precisa de uma porra de uma receita azul, mas para comprar crack, maconha e cocaína é só atravessar a rua!

*** Não comente***

Tu mencionou antes que estava com medo do teu marido pegar tua cocaína e jogar fora. Ele não sabe que tu usa?

Bom... saber ele sabe. Às vezes acordo com o travesseiro cheio de sangue, daí não dá para esconder. Mas vivemos numa boa, eu faço de conta que não cheiro e ele faz de conta que acredita!

E isso não atrapalha teu tratamento?

Ainda não, mas vai atrapalhar...

Como assim?

É que para sustentar meu vício eu vendo também, no dia em que a polícia me pegar eu to fudida! Acho que meu marido não vai nem me trazer cigarros na cadeia *risos*

***Ria junto*** Por que não?

Porque ele acha que eu sou uma boneca de porcelana (atenção para as relações de gênero) incapaz de descer do salto e subir o morro para pegar pó. Mal sabe ele que na verdade eu sou uma porca, que fica apanhando a cocaína que cai no chão do banheiro e enfia debaixo da língua. Tá achando nojento?!

*** Não importa o que tu ache, mas diga que não e solta um vago: Eu sei o que o vício é capaz de fazer com uma pessoa***

Eu não viciada, cheiro por esporte, quando eu quero parar, eu simplesmente paro. (atenção para a negação da paciente da própria situação) Mas como eu ia dizendo, eu ainda faço pior! Eu cheiro, cheiro, cheiro e depois que meu nariz já está muito congestionado eu assôo o nariz e chupo o que sai.

*** Não faça cara de nojo!!! Preste atenção no discurso auto destrutivo, na destruição do “eu” e aproveite para se aprofundar no assunto***

Mas e tu? Tu acha isso nojento?

Eu pessoalmente não acho. Acho que eu tenho que aproveitar o último grãozinho de farinha. Mas eu tenho vergonha de contar que eu faço isso.

Se tu não acha nojento, por que tem vergonha de contar?! (pergunta óbvia, mas tem que ser feita para se aprofundar na destruição do “eu”)

Porque eu sei que as outras pessoas vão achar isso nojento, mas para tu ver... é isso que o vício faz com a pessoa... (note a contradição, em primeiro lugar a paciente nega o vício, depois assume. Aproveite que ela está se assumindo viciada neste momento, e vá mais fundo na destruição do eu perguntando se ela já fez sexo por drogas).

Não... aliás já fiz sim!!! E foi por muito menos do que cocaína! Nem eu acredito nisso! Foi da última vez em que eu fui internada... Olha o que a internação faz com a gente: Eu fiquei com uma guria só porque ela tinha um isqueiro! Meu, só quem já foi internado num hospício tem a noção de quanto vale um isqueiro naquela prisão! Eu consegui entrar com uma maço de cigarros dentro da calcinha, mas tomaram meu isqueiro então não adiantava de nada. Eu não sou sapata, mas a dona do isqueiro deu em cima de mime eu fiquei com ela sim, só por causa do isqueiro!

***Tu já sabe que os internos do IPQ têm o direito de fumar 5 cigarros por dia, mas tu tem que fazer de conta que não sabe e perguntar se era proibido fumar ali***

Era mais ou menos proibido. Depois das refeições eles davam um cigarro para cada uma. Mas ali a gente simplesmente não tinha mais nada a fazer além de comer, dormir e correr atrás de cigarros o dia inteiro. Eles ( a equipe dirigente) Não se importava muito que a gente tivesse cigarros, mas se a gente fosse pego com fósforo ou isqueiro, eles viravam o bicho!!! Acho que eles morriam de medo que a gente fizesse um motim e incendiasse os colchões (risos)!!!

*** Ria também e aproveite a situação para perguntar se havia algum motivo para um motim***

Ai, claro que havia! Aquilo ali não era um hospital e sim uma prisão. Aliás, enquanto eu estava internada chegou a rolar um papo de incendiar colchões para provocar uma fuga em massa!!! A única que não queria um motim era uma grávida viciada em crack, que achava que estava sendo mais bem tratada ali do que na rua. Aliás, ela morava na rua e já tinha dado um filho para adoção e já sabia que ela iria ter que dar o filho que ela estava esperando para adoção também. Agora me responde tu, como uma viciada em crack que mora na rua tem coragem de ficar grávida pela quinta vez?!

***Não responda tudo o que tu sabe sobre desigualdade social, etc e tal. Aproveite que a paciente está demonstrando preconceito contra alguém quase na mesma situação dela para se aprofundar no “estigma, ria e pergunte: Como tu sabe que era o quinto filho dela? ***

Sabe, antes eu abominava quem usava crack, mas lá no hospício, as únicas pacientes que estavam de pé eram as que estavam lá por dependência química, menos eu. Então acabei ficando muito amiga dela. Por isso eu sei que era o quinto filho dela, ela me disse.

***Preste atenção, nossa paciente antes disse que era uma bonequinha de porcelana e agora já estava amiga de uma viciada em crack que morava na rua*** Volte no assunto e pergunte a ela se ela queria se amotinar também e por que?

Bom, querer fugir eu até queria, mas participar de um motim não!!! Eu tinha consciência que minhas condições físicas não eram as melhores para fugir. Eu sabia que seria pega e isso só serviria para aumentar meu tempo de internação. E também, eu não tinha um puto no bolso, teria que pegar carona para sair de lá, e eu não confio em carona.

Por que não? *** Preste atenção nas relações de gênero***

Porque não é seguro ... (silêncio) Tá bom, eu vou escrachar o verbo: porque os caras que dão carona só estão interessados em sexo.

*** Aproveite a degradação do “eu” para perguntar se ela seria capaz de fazer sexo para fugir do hospital. Não fique envergonhado com essa pergunta, nossa paciente é uma psicopata e vai responder o que lhe convém***

Sabe que eu não tinha pensado nisso?! Bom, se não fosse um cara muito escroto, eu teria coragem sim. Já fiquei com tantos caras que não retribuíram em nada, mais um não faria diferença.

*** Pronto, o assunto morreu, passe para a próxima pergunta***

3)Procurou tratamento no início dos sintomas? Por que?

Minha mãe foi quem procurou, me levou na psicóloga desde novinha.

4)Procurou algum tipo de tratamento alternativo? Se sim, como foi?

5)Agora vamos falar da tua internação.

a) Quantas vezes foi internado? Por que? (tentar detalhar ao máximo, perguntar o que aconteceu, como aconteceu, quem internou, etc. POR CADA VEZ).

b) Quem foram os responsáveis pela tua internação? ( Ouvir até o final sem interromper, caso o paciente distorça a pergunta e coloque a culpa em outras pessoas pela sua internação, perguntar no FINAL quem assinou a sua internação)

c) Já abandonou o tratamento alguma vez? Se sim, porque motivos. Se não, perguntar se pretende continuar o tratamento e por que?

c.2) Perguntar se toma todos os medicamentos nos horários certo. Por que?

6) Agora conte desde o início como foi tua primeira internação. (detalhar ao máximo)

b) Em caso de mais de uma internação, perguntar ao paciente também como foi a última internação (detalhar) e perguntar se houve alguma diferença entre a primeira e a última.

7)Qual é tua opinião sobre os outros pacientes internados contigo?

8) Tua vida mudou após o diagnóstico ou a internação? Se sim, perguntar como. Se não, perguntar por que.

9) gostaria de comentar mais alguma coisa? ( tentar detalhar o máximo)

quinta-feira, 3 de setembro de 2009

Enviei ontem o pré projeto de pesquisa.

Notem que eu coloco "transtornos mentais" num termo geralzão mesmo, eu tinha escolhido esquizofrenia, mas como a Profª Pediu para que os temas fossem escolhidos pela turma, eu enviei um email à turma perguntando se é melhor trabalhar com esquizofrenia ou T.A. Ainda estou aguardando resposta. Vou colar agora o pré projeto que eu enviei:


Projeto de pesquisa
Fatores de aderência ao tratamento de transtornos mentais dentro das narrativas dos itinerários terapêuticos do pacientes.
Introdução:
Este trabalho visa investigar a aderência ao tratamento de transtornos mentais de pacientes vinculados ao CAPS/HU.
Há pouca literatura sobre a aderência ao tratamento de transtornos mentais produzidos no Brasil, a maioria em nível secundário que tratavam mais sobre o abandono do tratamento do que sobre à aderência em si ( Cardoso, A. L. 2009). A maioria dos estudos encontrados tratam apenas das estatísticas, não se preocupando em investigar as causas do abandono ou da baixa aderência.
Temas correlacionados:
Itinerários terapêuticos, busca pelo tratamento, quem é a clientela, relações de gênero e parentesco, relações de trabalho, preconceito, comorbidades, relação médico-paciente, crenças, gravidade do transtorno segundo o próprio paciente, Impacto do diagnóstico, estigmas.
Objetivo geral:
Este trabalho visa através da análise de relações de gênero e parentesco, da análise de como os transtornos mentais afetam a vida social, econômica e afetiva dos pacientes, da análise dos itinerários terapêuticos, das crenças e noções gerais de cultura e bem estar que interferem na aderência do paciente ao tratamento de transtornos mentais.
Objetivo específico:
Este trabalho visa entender as razões da baixa aderência a tratamentos de transtornos mentais.
Métodos:
Serão feitas entrevistas com pacientes em tratamento de transtornos mentais no CAPS/HU. Serão entrevistas qualitativas nas quais os pacientes devem narrar seus itinerários terapêuticos.
Os critérios para a escolha dos entrevistados serão:
1) Estar atualmente em tratamento;
2) Responder à entrevista de livre e espontânea vontade.

Bibliografia:
ALVES, P.C. & MINAYO, M.C.S. Saúde e doença: um olhar antropológico. Ed. Fiocruz, 1998.
BECK, A. & FREEMAN, A. (Orgs) Terapia cognitiva dos transtornos de personalidade. Porto Alegre, Artes Médicas, 1993.
CARDOSO, A. L. A aderência à medicação em pacientes portadores de transtorno mental em uma Unidade Básica de Saúde. Tese de conclusão de curso, Florianópolis, 2009.
GOFFMAN, E. Estigma: notas sobre a manipulação da identidade deteriorada. Rio de Janeiro, Ed. Guanabara Koogan, 4ª ed. 1988.
KLEINMAN, A.M. Patients and healers in the context of culture. Berkley, University of California Press.
MACEDO, L.C., LAROCCA, L.M., CHAVES, M.M.N. & MAZZA, V.A. Análise do Discurso: uma reflexão para pesquisar em saúde. Disponível em http://www.scielo.br/pdf/icse/v12n26/a15.pdf

MUNSON, M.T. A “cultura da manequim”, anorexia nervosa e bulimia: uma reflexão sobre cultura e doença. Tese de mestrado, Florianópolis, 1998.
TUNDIS, S.A. & COSTA, N.R.(Orgs) Cidadania e loucura: Políticas de saúde mental no Brasil. Petrópolis, Vozes, 2ª ed. 1990.
VELHO, G. & DE CASTRO, E.B.V. O conceito de cultura e o estudo de sociedades complexas: uma perspectiva antropológica

terça-feira, 18 de agosto de 2009

Tive que adiar o inicio da pesquisa.

Hoje que era para eu apresentar o projeto de pesquisa para a minha professora, eu não vou poder ir à aula pois tenho que acompanhar meu namorado à consulta com o psiquiatra. O que aconteceu é que a crise dele passou com o uso de um anti psicótico, então fiquei achando que "alí tem coisa" e achei melhor encaminhá-lo a um psiquiatra.
É uma pena, já queria entrar com o processo no comitê de ética essa semana, mas como o projeto tem que ser aprovado pela minha professora antes, agora só semana que vem. Sexta feira vou tentar encontrar minha professora no horário do PPCC, talvez ela tenha alguém para indicar a trabalhar comigo.
Hoje vindo da faculdade para a casa e pensei bem no que o Prof. Walter me falou, para começar com apenas um transtorno mental e depois expandir durante o meu TCC. Como eu ainda vou ter que cursar métodos semestre que vem, esse semestre escolhi como tema a esquizofrenia mesmo, e semestre que vem, abordo os transtornos de personalidade.
Escolhi a esquizofrenia por 3 motivos:
- As alucinações dão margem à todo tipo de pensamento cultural.
- Todos percebem quando um esquizofrênico está em surto, sendo eles grande alvo de preconceito.
- A esquizofrenia não tem cura, tem controle. E tem também um caráter de pré disposição genética, aumentando as chances de um conflito familiar.

segunda-feira, 17 de agosto de 2009

Casa de ferreiro o espeto é de pau.

Nossa, eu tive uma briga muito séria com o meu namorado no sábado à noite. O que me preocupa é que ele ficou todo deprimido, sem sinais de melhora. Estou com medo de ter causado uma depressão muito profunda nele. Eu dei para ele 300 mg de bupropiona e rezando para que a bupropiona faça efeito logo! Fico em dúvida se não seria melhor 40 mg de fluoxetina, mas meu desespero é tanto que eu tô pensando em usar os dois, ou até mesmo um anti-psicótico.
Ele me disse que iria se increver na bolsa de oportunidades para mudar de estado, isso demonstra um estado depressivo muito grave, e a pessoa de cabeça quente, acaba não fazendo as melhores escolhas.
Estou preocupada.

Mais um trabalho.

Agora tenho mais um trabalho a fazer, em teoria sociológica! Com vendedores de carros/motos. A pior parte é que eu perdi meu livro do Goffman! Nem me lembro do título direito, era algo como a respresentação do eu no mundo moderno, eu iria usar isso como blibliografia para ver as relações de status na compra de um carro. Enfim, estou atolada de coisas para fazer!

Escolhendo transtorno mental.

Eu queria trabalhar mesmo é com psicopatas, ou cientificamente falando, Transtorno Anti Social de Personalidade, mas a maioria dos psicopatas em tratamento estão nas penitenciárias, então tive que excluir esse grupo.
Estou entre esquizofrenia e transtornos alimentares. Transtornos alimentares é um grupo bom pois muitos pacientes apresentam transtornos de personalidade nesse grupo. Enfim, acho que vou deixar para a coordenadora do CAPS escolher.

Rascunho de projeto.

Então, tenho que fazer modificações no rascunho do projeto. Segundo a Maris, ou eu trabalho com itinerários terapêuticos ou com aderência ao tratamento. Mas eu quero trabalhar um dentro do outro pois muita coisa no itinerário interfere na aderência.